O nosso corpo é templo da vida, é o espaço reservado para a
alma, é criação sublime de Deus e deve sempre permanecer sobre o comando do
Reino de Deus. Deus nos doa a vida e reserva um espaço para a alma ou espírito,
portanto o corpo é o templo da vida. Buscai, assim, em primeiro lugar, o Reino
de Deus e a sua justiça, e todas as outras coisas vos serão acrescentadas.
(Mateus).
Segundo Friedrich Novalis, só há um templo no mundo e é o corpo
humano. Nada é mais sagrado que esta forma sublime. Inclinar-se diante de um
homem é fazer homenagem a esta revelação na carne. Toca-se o céu quando se toca
um corpo humano.
A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem
moradas deslumbrantes que eles guardam para os pouco capazes de os sentir e
entender. E... nessas moradas estão tesouros da ternura humana. De que só os
diferentes são capazes. (Artur da Távola)
A alma é o sopro da vida, por Deus doado a um corpo emprestado do pó corruptível que carece ser zelado, fazer-se dele um templo. (Zinah Alexandrino)
O verdadeiro templo é a vida
A experiência de saúde está profundamente unida ao anúncio e
inauguração do Reinado de Deus. A vida saudável pede não só saúde física, mas
saúde emocional, espiritual, integração social... Jesus, em sua pregação e
realização do Reino, assumiu uma estratégia terapêutica que buscava fazer
emergir o ser humano sadio. Com sua presença, despertava e ativava tudo o que
era sadio em cada pessoa; esta era sua prioridade e não permitia que ela fosse
solapada por outros interesses. Ele se interessava pela saúde como processo de
crescimento da pessoa e onde há saúde o Reino faz-se presente
“Curar” e “libertar” eram atividades prioritárias na atuação de
Jesus. As verdadeiras curas e milagres de Jesus eram, antes de tudo, gestos de
humanização evangélica, que mostravam que o dinamismo final do Reino implicava
a destruição da enfermidade e da dor. As curas eram sinais libertadores, sinais
da presença e proximidade do Reino. Jesus não pregou saúde, mas gerou saúde,
transformando a vulnerabilidade em possibilidade e provocando mudanças de
atitudes e formas diferentes de viver.
Ao acessar o Evangelho de hoje, reconhecemos essa intuição
original. O horizonte do envio dos discípulos não é outro que o de favorecer a
vida. A “autoridade sobre os espíritos imundos” significa o compromisso em
favor da vida e das pessoas, frente àquelas forças que tendem a travar e
danificar a mesma vida. A partir desta perspectiva, a “missão” pode reencontrar
seu verdadeiro sentido. Enviados em favor da Vida, os discípulos sabem muito
bem qual é o encargo que Jesus lhes confia. Nunca O viram governando a ninguém;
sempre O conheceram curando feridas, aliviando o sofrimento, regenerando vidas,
destravando os medos, contagiando confiança em Deus.
A novidade de Jesus consiste justamente em afirmar que existe um
caminho para encontrar a Deus que não passa pelo Templo. Desse modo,
reconhece-se a vida como lugar privilegiado da Sua Presença. Para Jesus o mais
urgente era remediar o sofrimento daqueles que careciam de uma vida digna e
plena. Porque o Deus que Ele nos revelou não é o Deus que nos complica a vida
com normas e leis, senão o Deus que se humanizou para humanizar nossa vida. E
assim nos indicou que só quando nos fazemos mais humanos, nos fazemos mais
semelhantes a Ele que, para aliviar o sofrimento humano, se comprometeu e se
identificou com os que mais sofrem.
Transformação do templo em vida eterna
Jesus, presença visível da misericórdia e com a força da
torrente que jorra para a vida eterna, “chama a todos e a cada um em
particular” para que toda a nossa vida esteja exposta ao seu amor curador e a
prioridade do seu Reino relativize todo o resto. Ele quer fazer de nós discípulos e
discípulas, apaixonados por Ele e pelo seu Reino.
Ele se aproxima de cada um de nós para curar as nossas feridas,
nos convida a ir com Ele aos lugares onde a vida está mais em perigo e a
confiar na força secreta da compaixão e da esperança teimosa. Ele que no grão
enterrado debaixo da terra já contempla a espiga, revela-nos as possibilidades
de vida que se escondem onde parece que a morte tenha dito a última palavra. Ele
é o que dá a água viva, o samaritano que cura as feridas, o vencedor da morte,
o oleiro da nova Criação.
Só Ele que, ao revelar seu rosto no rosto de tantos excluídos e
sofredores, é capaz de despertar o “samaritano” que todos carregamos e que
permanece “adormecido” em nosso interior.
Por isso, quando o Evangelho de Marcos relata o encargo missionário que
Jesus comunicou aos seus discípulos, diz que Ele lhes deu “autoridade para
expulsar demônios e para curar toda sorte de males e enfermidades”.
É importante salientar que não se trata de uma “autoridade
doutrinal”, para afirmar verdades e condenar erros, senão que se trata de uma
“autoridade terapêutica”, para curar doenças e aliviar o sofrimento humano.
Jesus, submergindo-se no mar da dor, assume o infortúnio dos inocentes, dos
perdedores, das vítimas; Ele experimenta que o amor é paixão.
Doando Vida Eterna
Tudo se resume em dar vida, erradicar as dores, devolver a
dignidade aos que a perderam. Jesus, o “terapeuta do Pai”, continua passando
diante de cada um de nós, parando e fazendo um chamado que desperta comoção e
compaixão. Sua presença provocativa e seu chamado exigente colocam em questão
nosso costume de nos refugiar no mundo asséptico das doutrinas, na tranquilidade
de uma vida ordenada, satisfatória e entorpecida, na segurança de horários
imutáveis e de muros de proteção, longe do rumor da vida que passa longe de nós
e das lágrimas, dos gritos daqueles que sofrem e morrem nas periferias deste
mundo.
Escutar e seguir Seu chamado implica abandonar a estreiteza de
nossos caminhos e deixar o nosso coração bater no ritmo dos doentes e
marginalizados, vítimas da desumanização de nossa sociedade. O importante não é
pôr em marcha novas atividades e estratégias, senão desprender-nos de costumes,
estruturas e dependências que nos estão impedindo ser livres para contagiar o
essencial do Evangelho, com verdade e simplicidade.
Como evitar que a aventura, na qual um dia nos embarcamos,
nascida de uma paixão pelo Senhor e pelo seu Reino, transforme-se num tedioso
cumprimento de normas e costumes? Estamos, talvez, experimentando a frustração
de não ter acertado na rota da busca da vida plena e transbordante na qual
quisemos investir as nossas melhores energias: sentimo-nos cansados de palavras
sem significado e sentimos fome de proximidade, de presença, de compromisso.
Como Igreja, temos perdido esse estilo itinerante que Jesus
propõe. Seu caminhar é lento e pesado; não acertamos o passo para acompanhar a
humanidade; não temos agilidade para deslocar-nos em direção à margem
sofredora; agarramos ao poder e às estruturas que tiram a mobilidade; enredamos
nos interesses que não coincidem com o Reinado de Deus. É preciso uma profunda
conversão e voltar à essência do Evangelho: compromisso com a vida.
Não estaremos desperdiçando as nossas forças para conservar
atitudes arcaicas e nos deliciamos com um estilo de vida que nos atrofia? Não
chegou, talvez, o momento de deixar de repetir aquilo que fazíamos antes, e de
abrir-nos àquilo que está diante de nós, à novidade que o Espírito está
criando?
Felizes de nós se deixarmos afetar pela capacidade de
mobilização desse Samaritano!
(cf. Dolores Aleixandre)
Eu era como você, até perceber que tinha que morrer para essa vida profana. A Luz é somente para os justos e perfeitos, para os que mantém em seu templo sagrado o verdadeiro conhecimento. (Paulo Ursaia)
A vida rasga o véu do Templo. A regra não é nova, mas ainda
surpreende. Deus não vê cara, só coração. (Padre Fábio de Melo)
Abraços e muita paz!
Templo da vida e o sublime reino de Deus
Reviewed by Luís Eduardo Pirollo
on
julho 25, 2015
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